Homofobia mata mais um jovem trabalhador em São Gonçalo

Crime aconteceu em São Gonçalo, no Grande Rio

Por Marília Macedo, da Secretaria LGBT Rio.

Três anos depois do bárbaro assassinato do adolescente Alexandre Ivo de 14 anos, espancado, torturado e asfixiado até a morte por jovens skinheads em São Gonçalo, esta cidade vivenciou, na madrugada do dia 29 de abril, mais um caso brutal de assassinato motivado por homofobia. O jovem Eliwelton da Silva Lessa, 22 anos, trabalhador faxineiro de uma academia de ginástica de Botafogo, caminhava com mais dois amigos pela Estrada Raul Veiga, uma das mais movimentadas de Alcântara, quando foi chamado de “viado” por um motorista de van, que também o provocou mandando beijinhos. Indignado, o jovem reagiu à agressão, logo os dois começaram a discutir e a se atracar, quando os amigos de Eliwelton apartaram a briga.

Minutos depois, os três jovens estavam próximos ao local da briga quando o motorista da van invadiu a calçada e atropelou Eliwelton passando por cima dele três vezes. Ele teve a coluna fraturada em três lugares, três costelas e bacia quebradas, além do pulmão perfurado. O jovem ficou internado no Hospital Estadual Alberto Torres, no Colubandê, mas não resistiu à brutalidade sofrida, falecendo na quinta-feira, dia 2 de maio. O enterro foi na tarde do dia seguinte, no Cemitério de Pacheco, em São Gonçalo. Depois do sepultamento, amigos e familiares do rapaz, indignados, fizeram um protesto na Estrada de Pacheco. Eles queimaram galhos de árvores e chegaram a interromper o trânsito exigindo justiça, mas foram reprimidos pela polícia.

O crime foi registrado na 74ª Delegacia de Polícia de São Gonçalo, cujo titular é o Delegado José Veloso. Segundo matérias divulgadas na mídia, apesar dos amigos do jovem afirmarem que o crime foi motivado por homofobia, lamentavelmente, o delegado, até agora, descartou esta hipótese, afirmando que apenas o começo pode ter sido homofóbico, mas o desfecho foi por vingança. O acusado do crime homofóbico é Hélio Galdino Vieira, de 37 anos, conhecido como “Papai”, que está foragido e teve sua prisão preventiva decretada no dia 4 de maio pela Justiça. Ele está sendo indiciado por homicídio qualificado por motivo fútil, cuja pena prevista no Código Penal varia entre 16 e 30 anos de prisão. Segundo a imprensa, Hélio já tem três passagens pela polícia por violência doméstica, lesão corporal e ameaça.

A dura realidade por trás do assassinato de Eliwelton:

Infelizmente, o assassinato de Eliwelton é o retrato da dura realidade dos trabalhadores e da juventude LGBT pobre do nosso país. Realidade que começa nos bancos das escolas onde crianças e adolescentes têm que enfrentar o preconceito dos estudantes, dos profissionais de educação e muitas vezes até da própria família para conseguir concluir seus estudos. A homofobia é um obstáculo a mais, além de todos os outros que os filhos dos trabalhadores enfrentam para se formarem. Muitos jovens LGBT’s não aguentam e desistem de estudar, o que torna mais difícil conquistar melhores oportunidades de emprego. Na sociedade capitalista em que vivemos, marcada pela opressão e exploração dos trabalhadores, a carência nos estudos destes jovens combina-se com a homofobia  generalizada e naturalizada para lhes reservar os postos de trabalho e salários mais precarizados do mercado, normalmente, no telemarketing, comércio e nos serviços de faxina. A presença massiva de mulheres, negros, negras e LGBT’s nestes empregos, pior remunerados, demonstra como o capitalismo utiliza o machismo, o racismo e a homofobia para aumentar a exploração sobre os trabalhadores.

Eliwelton era faxineiro de uma academia de ginástica, o que não é uma coincidência, mas uma expressão dessa realidade. Jovens como Eliwelton, trabalhadores, negros e homossexuais, que, em regra, recebem salário mínimo, não podem pagar para se refugiar nos “guetos” gays, frequentados pela classe média e pela burguesia e, assim, exercer “livremente” sua sexualidade. Por isso estão mais expostos, cotidianamente, a todo tipo de violência homofóbica. Neste sentido, a cidadania LGBT tão alardeada pelas ONG’s e outras organizações do movimento, infelizmente, é só para os que podem pagar. 

Amigos de Eliwelton realizaram manifestação
contra homofobia
   As notícias de assassinatos veiculadas na mídia tornam-se cada vez mais comuns. As poucas estatísticas existentes são produzidas pelo próprio movimento (Grupo Gay da Bahia) e apontam que centenas de LGBT’s são assassinados todos os anos, o que torna o Brasil líder no ranking de assassinatos motivados por homofobia. Existe hoje uma onda de violência homofóbica que choca pela brutalidade e crueldade com que os assassinos matam os homossexuais, além da naturalidade com a qual julgam-se “no direito” de matá-los. Apesar desta realidade alarmante, a homofobia ainda não é crime em nosso país. Este fato cria um terreno fértil à naturalização da homofobia que se manifesta na intolerância e nas variadas formas de violência física e psicológica, bestializando os LGBT’s e banalizando seu direito à vida. Diante da ausência de previsão legal, por vezes, a polícia hostiliza aqueles que têm coragem de denunciar seus agressores, não se dedica a investigar e levar os acusados à Justiça ou mesmo se recusa a registrar nos boletins de ocorrência a motivação homofóbica do crime, como fez o delegado José Veloso, que investiga o caso Eliwelton.

Porque os governos não implementam medidas efetivas para mudar esta história?


A brutalidade sofrida por Eliwelton é a expressão de um grave problema social e fruto da inoperância dos governos em implementar medidas efetivas de combate à homofobia. O governo federal é o principal responsável por esta situação. Em dez anos, o PT, que tem maioria no Congresso Nacional, teve a oportunidade de aprovar a criminalização da homofobia através do PLC 122, o casamento civil e a adoção por homossexuais e de implementar o kit anti-homofobia nas escolas. Contudo, contrariando as expectativas e a confiança que criou através do seu discurso pró-direitos LGBT's, o governo permitiu, com o aval de Dilma, que o senador homofóbico Marcelo Crivella retalhasse o PLC 122, suspendeu o kit anti-homofobia nas escolas para salvar de uma CPI o ex-ministro-chefe da Casa Civil, Antônio Palocci, além de ter se retirado da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados para entregá-la ao controle do reacionário Partido Social Cristão (PSC), que elegeu o reconhecido machista, homofóbico e racista Marco Feliciano para Presidência da mesma.   As medidas que poderiam avançar nos direitos LGBT's não foram tomadas por uma opção política do governo federal em não se chocar com um setor importante da sua base aliada no Congresso: a bancada evangélica e católica que faz coro contra a pauta do movimento. Para manter estes setores homofóbicos como aliados e garantir a governabilidade necessária à implementação de suas principais medidas econômicas, Dilma utiliza os direitos LGBT’s como moeda de troca e, ao mesmo tempo, com um discurso “progressivo” segue iludindo diversos setores do movimento. Em meio à violência alarmante e às concessões feitas pelo governo à bancada homofóbica, os dois programas federais “Brasil sem Homofobia” e “Escola sem Homofobia” acabam sendo meras declarações de “boas intenções”, que não trouxeram melhorias concretas aos trabalhadores e à juventude LGBT e serviram muito mais para jogar as lideranças do movimento nas cadeiras dos gabinetes do que para avançar nos direitos. Segundo a Pesquisa de Informações Básicas Municipais – Perfil dos Municípios (Munic) de 2011 (IBGE), apenas 1,4% das cidades brasileiras possuem legislações sobre direitos LGBT's. De acordo com a Pesquisa de Informações Básicas Estaduais (Estadic) 2012, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), somente cinco estados da federação têm conselhos de direitos LGBT's.


Para um “Rio sem Homofobia” o primeiro passo é a criminalização!


O governo do estado do Rio de Janeiro foi um dos que seguiu as orientações do Brasil sem Homofobia, lançando o programa “Rio sem Homofobia”. O governo Cabral segue a mesma lógica do governo federal quanto às políticas LGBT's: declara boas intenções, para ganhar a confiança e os votos do movimento, mas não implementa qualquer medida concreta de combate à homofobia. O kit anti-homofobia não foi implementado nas escolas estaduais, a polícia recusa-se a registrar a motivação homofóbica dos crimes e maltrata os LGBT's que denunciam a violência, além disso, o governo continua omisso quanto à necessidade de criminalizar a homofobia. Lamentavelmente, as omissões e as concessões feitas pelos governos aos políticos homofóbicos fortalecem a bancada evangélica e católica que luta contra os direitos LGBT's, alimentando o clima de hostilidade e intolerância. Em suma, significam um grande retrocesso na conquista de direitos.

Estarmos ao lado dos amigos e familiares de Eliwelton para que seu assassino seja exemplarmente punido, porém, em nada resolve o problema da violência contra os LGBT's o coordenador do Rio Sem Homofobia acompanhar as investigações, conforme divulgou a impressa. Atuar num caso que ganhou repercussão na mídia não protegerá os amigos de Eliwelton da violência, não evitará as mortes de centenas de “Eliweltons” no Estado e no Brasil e muito menos garantirá que seus assassinos sejam investigados e punidos. A criminalização da homofobia é o primeiro passo para estancar a onda de violência que assola os  LGBT's, mas só lutando iremos conquistá-la.

Além dos interesses políticos, há muitos interesses econômicos envolvidos nesta discussão. Diversos empresários lucram rios de dinheiro com a homofobia como, por exemplo, os donos de casas noturnas, saunas, grifes de roupa, das paradas do orgulho gay etc. Existe hoje no Brasil uma forte “indústria pink”. Além disso, há aqueles que, apoiados no preconceito, pagam os piores salários aos trabalhadores LGBT's. Somente na luta podemos arrancar a criminalização da homofobia e transformar esta sociedade, que explora os trabalhadores e utiliza a homofobia para aprofundar essa exploração, numa sociedade verdadeiramente igualitária e livre, numa sociedade socialista!


Fora Feliciano e o PSC da CDHM!

Criminalização da homofobia, já!

Em defesa do kit anti-homofobia nas escolas!

Aprovação do casamento civil já!

Pela construção de uma sociedade socialista!